Com o pé no acelerador

Assim como as avenidas marginais de São Paulo tiveram a velocidade aumentada, a administração da maior cidade da América Latina pisou no acelerador no primeiro mês da gestão João Doria. Independentemente do mérito e do ainda incerto resultado de suas medidas, o estreante começa a criar uma nova referência para a gestão municipal. Mais frenética, menos sensível a polêmicas e mais obstinada por eficiência e soluções criativas. Não entendeu nada quem esperava um empresário protegido pelo ar-condicionado do Palácio do Anhangabaú, preocupado apenas em evitar o suor na camisa Ralph Lauren e em contemplar as demandas dos Jardins.

Nas primeiras semanas do mandato, o gabinete de Doria dispensou paredes e endereço fixo. Seu local de trabalho foram as ruas. Logo no primeiro dia de expediente vestiu o uniforme de gari, peça de marketing adequada para promover o Cidade Linda, programa composto também de limpezas controversas como a remoção não apenas de pichações mas também de grafites.

Sua agenda foi dominada por ações para as classes mais pobres, em alguns casos com soluções fora do lugar-comum. Doria desconcertou quem associa a solução para a saúde pública à lógica de construir mais postos. Por meio do programa “Corujão da Saúde”, clínicas e hospitais particulares, entre eles centros de excelência como o Sírio-Libanês, oferecem exames extras em horários alternativos, preferencialmente das 20h à meia-noite, conforme a capacidade ociosa de cada local. A meta é zerar em 90 dias a fila de 485,3 mil exames – nela estão pacientes com até três anos de espera.

A rotina frenética

No primeiro dia depois da posse, João Doria se vestiu de gari, e com sua equipe também uniformizada, demonstrou a importância do engajamento dos servidores no lançamento do Programa Cidade Linda. A ação, iniciada na Avenida 9 de Julho, é concebida para revitalizar áreas degradadas da capital paulista, com mutirões de limpeza e manutenção a cada semana concentrados em um ponto da cidade e prometidos para durar quatro anos.

“Este é o primeiro dia útil do nosso mandato, e já começamos trabalhando”, afirmou Doria. “Desde as 6h da manhã, com todos os secretários. Todos os presidentes das empresas públicas municipais estão aqui. E estamos aqui dando um exemplo de servidor. Eu sou um servidor público, assim como todos os demais secretários aqui presentes.”

Solução VIP na Saúde

Para zerar a fila de meio milhão de exames, o programa “Corujão da Saúde” contou, no seu lançamento, com oito hospitais particulares credenciados, entre eles o Hospital do Coração (HCor), o Sírio-Libanês e o Oswaldo Cruz. A estratégia é aproveitar a capacidade ociosa das instituições, principalmente à noite.

“Em 90 dias nós iremos zerar o déficit dos exames públicos na rede municipal”, prometeu João Doria. “A partir de então, os exames serão realizados em caráter de normalidade, com prazo de 30 dias pela rede pública municipal e, circunstancialmente, também pelas redes privada e estadual.”

Guerra do spray

Em uma cruzada contra o vandalismo, a nova administração de São Paulo removeu pichações, mas ao apagar também grafites criou um desgaste com defensores desse tipo de manifestação artística de rua e desafiou os pichadores a responderem com ainda mais motivação. A operação começou na 23 de Maio, com a pintura de tinta cinza na mureta sobre os grafismos.

Depois de repercussões negativas, sobre a questão da falta de critério entre pichação e arte, o secretário municipal de Cultura, André Sturm, afirmou que a avenida poderia voltar a ficar colorida ainda no primeiro semestre deste ano, via um Festival do Grafite, com artistas selecionados e materiais fornecidos pela gestão municipal.

Inspirado por Covas

Em sua quarta semana, o programa Cidade Linda se concentrou na Avenida Santo Amaro, na Zona Sul. Na abertura do programa, o prefeito recuperou o abrigo de ônibus do corredor da Avenida Santo Amaro vestido com o uniforme das equipes de manutenção de mobiliário da Secretaria de Obras. A faxina nas vias se confirma como uma das marcas da gestão Doria, que à época da campanha municipal criticou o antecessor, Fernando Haddad, pela suposta negligência na zeladoria da metrópole.

Uma das inspirações é o avô do vice-prefeito Bruno Covas. Quando na prefeitura (1983-1986), Mário Covas lançou mutirões com a ajuda de líderes comunitários ? e foi o padrinho político de Doria, ao lhe convocar para o primeiro cargo público, como secretário municipal de Turismo.

Pontapé inicial

É de grama sintética o novo campo futebol do clube da Comunidade União Cultural e Recreativa Amizade, na Vila Carioca. Por meio de um programa com o nome de Bate Bola, a iniciativa será expandida a outro espaços da capital paulista, como uma das estratégias para evitar que as crianças trilhem o caminho das drogas e do crime.

“A instalação da grama sintética vai permitir que as pessoas, sobretudo as crianças e jovens, possam ter na prática esportiva uma conduta melhor”, disse Doria, após dar o pontapé inicial para o jogo inaugural do novo gramado. “Vamos ajudar a educação dessas crianças, afastando do mau caminho e trazendo o espírito de coletividade.”

Praças para adoção

Como uma de suas iniciativas inspiradas em Mário Covas, o novo prefeito de São Paulo convidou a população a participar do programa “Adote uma Praça”. O objetivo é subir de 400 para 5 mil áreas verdes da cidade conservadas por parceiros, entre pessoas físicas e jurídicas.

O convite ocorreu na Praça Adolpho Bloch, Zona Sul, onde foi a vez de Doria ser fotografado como jardineiro. O local, antes cercado com grades, foi adotado pela empresa Farah Service e reaberto para a população, com equipamentos novos e iluminação da praça substituída por lâmpadas de LED.

Entrevista para a Revista VOTO

Entre um e outro lançamento, João Doria respondeu a perguntas formuladas pela VOTO. Com concisão, expôs três obsessões: eficiência, inovação e transparência. E fez uma escassa concessão à retórica, ao buscar “a gestão da cidade para a maioria silenciosa, e não para a minoria ruidosa”. A frase explica por que ele foi eleito e por que esperar ainda muito barulho na repercussão a suas medidas.

Acompanhe a seguir um retrato do primeiro mês do novo prefeito paulistano, em seu ofício de transportar o aprendizado na iniciativa privada para a gestão pública.

Na eleição, o seu principal oponente, assim como o seu principal aliado, foi o eleitor farto de políticos. A soma de abstenções e votos de protesto chega a superar a sua própria votação. E sua vitória é explicada em parte por ser o “antipolítico”. Para uma próxima eleição, o Sr. passa a ser um político que já teve mandato. Como resgatar esse eleitor para voltar a confiar em políticos?

Cumprindo a obrigação do servidor público. Fazendo com que ele realize aquilo que representa o real interesse da população, de maneira honesta e transparente.

Soluções, como a parceria com os hospitais privados de São Paulo, foram a primeira mostra ousadia e inovação. Como o Sr. avalia a reação a elas e o que vem mais?

Fazer gestão com inovação, com transformação, saindo do lugar-comum e buscando soluções que sejam viáveis, sejam possíveis, sejam adequadas para a população e ao menor custo para o erário público.

Se a cidade de São Paulo fosse uma empresa, o Sr. diria que a principal conquista buscada no primeiro ano do business plan é…

Agir com eficiência, transparência, inovação e sempre a serviço da população mais humilde e mais pobre da cidade.

Quais são os desafios de adaptação de um gestor bem-sucedido na iniciativa privada que busca ser eficiente também na administração pública?

É o desafio de fazer gestão correta, fazer a gestão atendendo a prioridades e fazendo o que precisa ser feito. Sobretudo, fazer a gestão da cidade para a maioria silenciosa, e não para a minoria ruidosa.

A educação no Brasil, seja pública ou privada, é na média muito abaixo do desejável para um país que ambiciona se desenvolver. Qual será a sua contribuição para corrigir essa deficiência?

A contribuição de ser um gestor eficiente, correto. Fazer na principal cidade do país uma gestão que atenda às carências da cidade em saúde, educação, habitação, mobilidade urbana, inovação e geração de empregos e oportunidades. Se fizermos isto em São Paulo, será uma contribuição importante não apenas para a cidade mas para o país.

 

Foto de capa: FABIO ARANTES/SECOM

 

 

 

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