Corrupção: causas e soluções em todas as pontas – Por Germano Rigotto

Não nos enganemos imaginando ser fácil combater a corrupção. Essa disposição só terá significado se for profunda e multilateral, assim como são suas próprias causas. Soluções simplistas para problemas complexos normalmente geram resultados errados ou insuficientes. O psicanalista Luiz Hanns, em uma análise elucidativa, trata disso em uma aula publicada pela Casa do Saber. Ele mostra que há pelo menos três tipos de corrupção que se reforçam e reproduzem.

A primeira delas é a sistêmica, que junta pessoas de mau caráter com um sistema vulnerável a desvios. Empresários gananciosos e detentores de cargo públicos inescrupulosos acham brechas para a ilicitude disfarçada. Isso pode ser combatido com um controle mais eficiente, capaz de diminuir a impunidade. O Brasil precisa vencer a sensação de que o crime compensa.

A segunda é a corrupção endêmica: uma cultura impregnada pelo desvio, o famoso “jeitinho brasileiro” – somos o único lugar do mundo em que delinquir ganhou até designação carinhosa. Engloba a postura de quem se revolta contra o escândalo do setor público, mas pratica e naturaliza pequenas corruptelas cotidianas. Tais como não devolver um troco dado a maior, subornar o guarda ou o fiscal, furar a fila, usar a vaga de estacionamento destinada ao deficiente físico, e por aí afora.

Esse desvio se combate com uma cultura inversa, a ser fomentada pela mídia e por outros meios de formação da opinião pública. O assunto deve estar em todos os lugares: campanhas publicitárias, escolas, igrejas, clubes comunitários, entidades sociais, telenovelas, livros, teatros, músicas, roteiros humorísticos. Precisamos falar da ladroagem dos políticos, mas também das pequenas e grandes transgressões éticas que a própria sociedade pratica ou aceita. E repudiar a corrupção em todas as suas formas.

As duas espécies que citei deslizam uma em direção à outra. Elas reificam o sistema e se retroalimentam. O crime é sempre o encontro de uma intencionalidade com uma ocasião. A ocasião faz o ladrão, diz o ditado. Pois bem: nossa organização institucional e essa parte negativa do nosso caldo cultural formam um casamento perfeito para a desordem. Isso precise ser freado.

A terceira espécie de corrupção citada por Hanns é a sindrômica, que tem várias causas, fatores e vertentes. Está latente na burocracia e na visão patrimonialista do Estado. Envolve as inúmeras leis inexequíveis ou aquelas que viraram letra mota. O descrédito do arcabouço legislativo é o oxigênio para fazer esse sistema contraditório respirar. Some-se a isso a falta de fiscalização. E está feito o ambiente que confere normalidade e moralidade a algo que, na verdade, está corroído por dentro. Serve ao aparelho estatal corruptível, serve ao cidadão corruptor.

Veja-se, então, que o combate à corrupção não terá sucesso apenas pelo moralismo ou tampouco pela escolha de indivíduos honestos. A mera renovação dos nomes da política, igualmente, por mais salutar que possa ser, também não será suficiente. Nem os tribunais e os órgãos de fiscalização conseguirão, por mais que queiram e tentem, acabar com essas práticas. Tanto é assim que, mesmo depois da Lava-Jato, muitos continuam delinquindo com a maior desfaçatez. Esses papéis são importantes, sem dúvida, mas precisamos de muito mais.

A chaga da corrupção é uma espécie de metástase. Não estamos diante de uma patologia que possa ser curada com analgésicos. Precisamos gerar consciência de quão grave é o nosso quadro e, a partir disso, despertar um verdadeiro levante de mobilização, incluindo dos políticos aos cidadãos mais simples. É hora de uma revisão cultural, constitucional e institucional profunda. De cultivar uma espécie de tolerância zero com a corrupção, mas sem generalizações – que só beneficiam os maus. Ou vamos a fundo no problema, atacando em todas as suas pontas, ou continuaremos patinando como nação. É nosso dever legar um país melhor às gerações que nos sucederão.

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