De portas abertas

Nestes 13 anos de existência, a Lei de Recuperação Judicial trouxe diversos ganhos para a sociedade. Negócios – e tudo incluído neles, como oportunidades de trabalho e pagamento de impostos – foram retomados, o que, de outra forma, teriam fechado as portas, deixando um rastro de perdas, dívidas e desemprego. A legislação sozinha não seria suficiente para salvar muitas operações. Além dos advogados da empresa e da Justiça, também conta muito nessa hora o papel desempenhado pelo administrador judicial. A atividade, mais conhecida pelas iniciais AJ, foi aumentando o seu contorno de profissionalização e trazendo ainda mais eficiência para os resultados.

É o AJ que organiza a lista de credores, preserva ativos e realiza a Assembleia Geral de Credores (AGC). Em razão das responsabilidades e complexidades das tarefas desenvolvidas, as equipes precisam ser multidisciplinares, além de serem capacitadas e experientes na realização das diferentes atividades para processo de recuperação dar resultado.

“Com o tempo, os juízes começaram a ver que, para o bom andamento, era importante a recuperação ser conduzida por alguém com expertise. Então, empresas especializadas foram se consolidando depois da lei de 2005”, conta o advogado João Medeiros, sócio da Medeiros & Medeiros Administração Judicial, com 22 anos de experiência no setor.

O AJ é nomeado pelo juiz no despacho do pedido de recuperação judicial, sendo um auxiliar qualificado da Justiça para a efetivação do processo. “O administrador não dá apenas um suporte de estrutura para o juiz. Com o conhecimento que dispõe do assunto, vem com um espírito de auxiliar o processo como um todo, que, muitas vezes, envolve contratos extremamente complexos, além das questões sociais”, acrescenta Laurence Medeiros, advogado e também sócio do escritório.

Do síndico ao AJ

Antes da Lei 11.101/05, na vigência da Lei 7.661/45, quem ficava à frente do processo era chamado de síndico da massa falida ou comissário da concordata. Diferentemente do que ocorre hoje, o síndico era escolhido entre os maiores credores. Em um importante avanço, surgiu o AJ, alguém com amplos conhecimentos jurídicos, de administração, contabilidade e economia.

Em linhas gerais, a atividade se assemelha a de um fiscal, por acompanhar e fiscalizar o processo de recuperação da empresa. O administrador também intermedeia relações entre os credores e a Justiça. Mas não representa os credores, tampouco a empresa em recuperação judicial ou o falido. De qualquer forma, os atos praticados pelo AJ devem estar sempre em consonância com o que determinar a Justiça e andar dentro dos limites legais. “Como são poucas as varas especializadas, e os juízes têm infinidades de outras matérias, o papel do AJ se torna mais importante ainda”, ressalta Laurence Medeiros.

Atualmente está em andamento a quarta maior recuperação judicial do país, do Grupo Ecovix, em Rio Grande (RS), com dívida de quase R$ 8 bilhões. O escritório Medeiros & Medeiros, como administrador judicial, conduziu a AGC realizada no fim de junho. No encontro, os credores aprovaram o plano de recuperação.

O quórum proporcionou a validação do plano pelas quatro classes de credores, reforçando a legitimidade de todo o processo. Para conduzir essa etapa, a Medeiros & Medeiros organizou uma estrutura completa no auditório principal do Villa Moura Executivo, em Rio Grande.

Na entrada, cada participante recebeu pulseira de cores diferentes para identificar qual classe de credor representava. Todas as etapas foram registradas, também, por fotografias e vídeos. No momento das decisões, foi utilizado um sistema de votação via keypad, proporcionando segurança, transparência e resultado imediato, projetado em um telão. Os participantes com direito a voto digitavam suas opções em aparelho semelhante a uma calculadora, o que facilita o andamento de assembleias de grande porte, como foi o caso da AGC do Grupo Ecovix.

Poucas horas depois de encerrado o encontro, a ata já estava disponível no site do escritório, assim como todos os documentos referentes à empresa. Uma área do site com dados das empresas em falência ou recuperação passará a ser obrigatória se for aprovada a modernização da Lei de Recuperação Judicial, em tramitação no Congresso.

Esperança de Retomada para Polo Naval

O processo de recuperação judicial do Grupo Ecovix começou em dezembro de 2016. Os ativos da empresa em Rio Grande são avaliados em US$ 1 bilhão, incluindo o maior dique seco do Hemisfério Sul e dois pórticos para a movimentação de partes e peças para a montagem das gigantescas estruturas marítimas, como plataformas de petróleo.

Originalmente, a Assembleia Geral de Credores estava marcada para 15 março, mas foi suspensa um dia antes da realização em razão de liminar concedida pela 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), em Porto Alegre. No fim de abril, o TJ-RS autorizou, por unanimidade, a retomada da AGC.

O acordo aprovado na AGC realizado no fim de junho põe fim a uma espera de um ano e meio e traz novas perspectivas para a estrutura no polo naval em Rio Grande, com oportunidade para beneficiar a Região Sul e todo o estado.

Uma consultoria especializada no setor elaborou um estudo para avaliar a potencialidade da operação além da construção de cascos para plataformas de petróleo. O Grupo Ecovix pretende ingressar em novas áreas, como na atracação de embarcações e movimentação de cargas, reparos em plataformas petrolíferas e embarcações e processamento de aço para a indústria metalmecânica.

A movimentação de carga não afetaria a operação naval. Há empresas instaladas no Rio Grande do Sul interessadas em montar uma estrutura para a carga e descarga de mercadorias — área de atuação que dependeria de liberação do Estado. Da mesma forma o processamento de aço. Os equipamentos instalados no estaleiro têm condições de entregar diferentes cortes e perfis. Também está em estudo a finalização da P-71, que está 30% montada dentro do dique seco.

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