É melhor já ir se acostumando

A experiência ensina que um governo recém-eleito carrega para a fase de transição e o mandato ingredientes que estiveram presentes na campanha eleitoral. E a campanha de Jair Bolsonaro foi disruptiva. Bolsonaro venceu contrariando os manuais do marketing político, a mídia e os analistas acadêmicos.

A inteligência política do presidente eleito foi e – continua sendo – subestimada por essa gente que passou a campanha toda chamando Bolsonaro de tosco. Alegavam que sua retórica radical de “extrema-direita” o isolaria e impediria a conquista do eleitorado mais ao centro. Apontavam que não tinha estrutura partidária, alianças, coligação e palanques regionais. Diziam que não tinha tempo de TV nem recursos do fundo partidário. E previam que cairia nas pesquisas e perderia por todas essas razões.

Se o presidente eleito conseguirá ou não governar, veremos. Porém, com suas ações e decisões ao longo da campanha, ele derrotou sistematicamente todos esses pressupostos que serviram de argumento dos seus críticos. E é preciso reconhecer: Bolsonaro venceu praticamente sozinho, pois, com toda a confusão que se percebia nos bastidores do comando da sua campanha, a palavra final sobre cada passo da estratégia sempre foi dele. Os critérios foram amparados na sua análise política e no seu diagnóstico sobre o sentimento do povo brasileiro – e não orientada pelos critérios de marqueteiros escravos de pesquisas.

Bolsonaro foi eleito pela facada? Discordo. É óbvio que um fato político dessa magnitude interferiu no curso da eleição. No entanto, é preciso reconhecer que, após o fato, é preciso tomar decisões estratégicas sobre como agir a partir do ocorrido. E, novamente, Bolsonaro, mesmo convalescendo e ainda em estado grave na UTI, tomou as decisões corretas e agiu de forma a garantir que os desdobramentos do fato o beneficiassem eleitoralmente.

Talvez muitos sequer tenha notado, mas Bolsonaro não é o mesmo de antes da facada. Não perdeu sua essência, mas mudou, tornando-se mais sóbrio, sereno e ponderado. Um simples exemplo sintetiza essa mudança. A última vez que Bolsonaro foi visto fazendo o gesto-símbolo das duas mãos simulando armas (o inverso do “L” dos lulistas) foi na primeira foto tirada dele sentado numa cadeira ainda na UTI, com o avental azul e a sonda no nariz. Tendo visto a morte de perto, Bolsonaro emerge do atentado como um ser humano amadurecido e um líder em melhores condições e posicionamento para ser o presidente de todos os brasileiros.

Curioso é perceber que a mídia e seus comentaristas políticos, assim como os analistas acadêmicos, salvo raras exceções, seguem sem entender o “fenômeno Bolsonaro”. Continuam repetindo o erro metodológico de querer enquadrá-lo nos seus conceitos e nas categorias de análise – aqueles mesmos que o presidente eleito sepultou na eleição.

Grande parte do jornalismo político se dedica a criticar Bolsonaro pelo fato de ele não tomar decisões e nem se comportar como o pensamento mainstream gostaria que ele se comportasse. “Bolsonaro não deveria ter dito isso”; “Bolsonaro não deveria ter feito aquilo”; “Bolsonaro vai ter de negociar com os partidos”; “ao escolher Moro como ministro, Bolsonaro marcou um gol, mas…”; “Bolsonaro não é liberal e não deixará Paulo Guedes implantar seu programa econômico”; “Bolsonaro nem foi empossado, mas foi derrotado no aumento dos juízes e tomou uma aula de política do Eunício de Oliveira”; “Bolsonaro isso”; “Bolsonaro aquilo” e blá, blá, blá…

Outro sintoma dessa incompreensão é a insistência com que brandem o livrinho da Constituição de 1988, como que tentando engessar Bolsonaro nos parâmetros da ordem política, econômica e social de um texto constitucional cujo resultado é o desastre em que o Brasil se encontra. Aqueles que assim o fazem, são os mesmos quem se beneficiam dos privilégios e injustiças que a Constituição de 1988 cravou no bolso dos pagadores de impostos da nação.

Ao assim agirem, esses agentes da mídia e do establishment político e econômico não apenas revelam seus justificados temores de desalojamento das suas confortáveis posições privilegiadas no sistema que será desestruturado, como alinham-se ao mentiroso discurso eleitoral do PT, que perdeu a eleição acusando o presidente eleito de querer reinstituir o regime militar de 1964.

O povo brasileiro sepultou a Nova República num processo que começou com as jornadas de 2013, prosseguiu no impeachment de Dilma e deu mais um passo com a eleição disruptiva de Bolsonaro. O presidente eleito e a cúpula das Forças Armadas têm reiterado o respeito a essa Constituição, pois não existe de fato nenhuma intenção de impor mudanças fora dos parâmetros da democracia. Contudo, é forçoso reconhecer que o programa econômico liberal de Bolsonaro – que, se for implantado em sua essência, vai mudar para melhor nossas vidas e nossa ordem social – requer também um novo ordenamento jurídico, político, econômico que é incompatível com o texto constitucional de 1988.

E as condições para isso acontecer estão postas. Se o Brasil começar a tomar o rumo certo do ajuste fiscal, das privatizações e concessões e da liberalização da economia num contexto internacional de dificuldades que se apresentam para outros mercados, nosso país se tonará um estuário receptor natural do capital que virá em grande volume de investimentos em busca do lucro.

Como o presidente eleito vai superar o desafio de convencer o sistema político a fazer as mudanças constitucionais necessárias para destravar nossa economia e dar vazão às mudanças que o povo delegou a ele fazer, sem concessões ao falecido presidencialismo de coalizão, é uma incógnita.

Mas, pelos nomes que o presidente tem escolhido para seu Ministério até o momento que este artigo é escrito, o presidente revela a firme convicção de que pretende entregar ao povo brasileiro aquilo a que se propôs a fazer como candidato. Esses nomes – mais do que as tensões, idas e vindas, anúncios e recuos – são um indicador mais importante dos rumos que o presidente eleito que dar a seu governo do que qualquer outro. A inovação é, assim, cheia de incertezas e surpresas. Mas o rumo está claro.

Quem queria que nada mudasse votou no candidato do PSDB no primeiro turno e no candidato do Lula no primeiro e no segundo turno. Portanto, se Bolsonaro se comportasse exatamente como a maioria dos comentaristas da mídia ou dos analistas acadêmicos desejam, ele não seria Bolsonaro. Seria um Alckmin ou um Haddad.

O povo votou pela mudança de verdade. O povo votou em Bolsonaro. Gostem ou não da mudança que vem aí, gostem ou não do jeito diferente de ser dele, a mudança virá, e virá sob a liderança do presidente eleito democraticamente. A inteligência recomenda não subestimar a capacidade política de um líder que venceu como ele venceu uma eleição na qual o establishment passou o tempo todo prognosticando e desejando sua derrota.

É melhor já ir se acostumando.

Por Paulo Moura

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