Eleições americanas: Convergência e Disparidade com o Brasil

Tive a oportunidade de acompanhar em Boston, na Harvard University, a votação legislativa americana, na última terça-feira (06/11) e depois estive na The George Washington University, para debater os resultados das eleições – seus efeitos e consequências na vida dos republicanos e democratas, e principalmente de Trump, durante o seminário “Elecciones legislativas em EE.UU. Fin o consolidación del paradigma Trump?”. E um dos fatos que me chamou a atenção, já no início da semana das eleições, foi o de que o Facebook bloqueou milhares de contas suspeitas de serem perfis falsos ou serem operadas por robôs, a fim de evitar o risco de que essas contas disparassem fake news e fizessem outras formas tentativas de influenciar o eleitorado americano.

Embora não houvesse prova concreta ou denúncia sobre os perfis falsos ou algo parecido, o Facebook antecipou-se a uma possível crise, na qual poderia tornar-se alvo dos usuários e do Poder Judiciário devido ao uso da plataforma para veicular fake news com fins políticos-eleitoreiros. Isto ocorreu porque, nos Estados Unidos, o processo é sempre dirigido a quem veicula a notícia falsa, enquanto no Brasil o Facebook é considerado uma mídia como outra qualquer. Infelizmente, em nosso País, as redes sociais são percebidas como “sociais”, ou seja, pertencem às pessoas. E assim, considera-se que são as pessoas que veiculam fakes news, e não os “veículos”. Está na hora, contudo, e urgentemente, de considerarmos as redes sociais como mídia – Facebook, Instagram, Google, Snapchat e outros. Todas as empresas que aceitam publicidade, ou vendem acesso aos seus usuários, devem ter a responsabilidade primeira de serem responsáveis pelo seu conteúdo.

Os meios de comunicação – que, em minha opinião são todos, incluindo as redes sociais -, como em toda eleição, trabalharam a todo vapor. Debates, publicidade (nos EUA todas são pagas) e opiniões nas redes sociais ocuparam a pauta intensamente a partir do fim de semana antes das eleições. Sim, tudo foi muito parecido com o Brasil – as eleições foram tomando conta das pautas e das conversas das pessoas praticamente nas últimas duas semanas, quando a eleição entrou na fase da publicidade pelas redes sociais ou pela TV – o que me levou a acreditar que a consciência política da população não é maior ou menor porque elas discutem mais ou menos política, ou porque decidem na hora do voto. Devemos entender que a política é um ato de sentir e viver no dia a dia os efeitos que as atitudes dos políticos exercem sobre todos nós. Como os políticos agem em favor de poucos e privilegiados, a política sempre fica para ser discutida no final, principalmente porque, para as pessoas, não vale a pena discutir, todos os dias, aquilo que faz mal. Assim como uma doença na família: você não fica discutindo e falando todo o tempo da doença com seus familiares. Infelizmente.

Em relação à importância das verbas de campanha utilizadas em publicidade eleitoral, pelo menos no pleito para a Câmara dos deputados americana, a força arrecadatória dos democratas parece ter ajudado. Eles angariaram mais do que os republicanos: foram US$ 923 milhões obtidos pelos 1.507 candidatos democratas à Câmara, em comparação a US$ 621 milhões dos 1.217 candidatos republicanos. Na campanha ao Senado, contudo, a tradição prevaleceu, e os republicanos obtiveram a maioria, mesmo tendo arrecadado bem menos do que o montante dos US$ 396 milhões dos democratas.

No Senado, seria surpreendente a vitória democrata, ou melhor, seria uma grande derrota para Trump. O Senado sempre foi mais conservador, e desde 2010 os republicanos dominam e são maioria. Na Câmara, a situação é diferente. Os democratas são tradicionalmente maioria, e nas eleições intermediárias (no meio do mandato presidencial) eles conseguem expor mais as fragilidades do governo – e o de Trump tem muitos pontos negativos: imigração, perseguição aos imigrantes, saúde precária, etc. Do lado dos republicanos, eles se apoiaram na economia, que vem se recuperando com muita força – e a geração de empregos foi o ponto mais forte da campanha. O agronegócio retomou sua força, e assim o interior dos Estados Unidos se uniu em apoio aos republicanos.

A votação dos democratas poderia ter sido ainda maior se não fosse a ausência, nas urnas, dos latinos americanos que vivem no país, e que, mesmo estando com os documentos em ordem, não votaram, para não serem descobertos ou “chamar atenção”, porque eles têm medo de perder os seus direitos. O Trump causa esse efeito do medo nas pessoas, e esta atitude dele é muito bem pensada. Como ele sabe que o eleitorado latino é mais democrata, usou esse medo a seu favor, principalmente nessas eleições intermediárias, onde o face a face é mais constante e os boatos alimentaram a imaginação dos mais simples.

Em resumo, os EUA são um país muito dividido e com alguma semelhança com o Brasil, embora menos sobre o tema corrupção, que é tratado na Justiça, e não nas eleições, e também diferente no que toca ao tratamento dado à veiculação de fake news, que, mesmo após as eleições brasileiras, continuam sendo disseminadas pelas redes sociais e aplicativos.

Por Dudu Godoy, VP de mídia da agência NBS e presidente do SINAPRO – Sindicato das Agências de Propaganda do Estado de São Paulo

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