O pleito imprevisível

O que acontecerá nas noites de 7 e 28 de outubro, quando forem abertas as urnas? Em resumo, a resposta de muitos analistas políticos é que tudo pode acontecer. Há um consenso: esta é a eleição mais imprevisível desde a redemocratização.

Em recente avaliação, a agência de risco Fitch considerou o ambiente político brasileiro como “desafiador”, em meio a uma disputa eleitoral “fragmentada”, com incertezas sobre os nomes que estarão no segundo turno. Também apontou dúvidas sobre como se dará a governabilidade a partir de 2019.

As imprevisibilidades são geradas por um complexo cenário, que congrega lenta retomada da economia, alto nível de desemprego, queda dos principais nomes da política tradicional e insatisfação geral da população. O quadro também foi alterado pela redução do tempo de campanha e novas regras de financiamento.

“O instrumental que você tinha à mão para análise, a partir da observação de várias eleições, fica limitado frente a todas essas condições”, justifica o cientista político Leonardo Barreto, da Factual Análise, ao comentar o intrincado quadro eleitoral de 2018. Ele acrescenta outro fato novo deste pleito, na comparação com as últimas décadas: um governo federal sem chances de dar sequência ao seu projeto político.

“Normalmente, o governo que está terminando tenta exercer o controle de sua sucessão, buscando a reeleição ou indicando o sucessor, agregando as legendas em torno dele. Como o governo Temer está sem capacidade para isso, houve uma pulverização das candidaturas”, diz Barreto.

O fator Haddad

Talvez a principal incógnita do pleito esteja na situação do Partido dos Trabalhadores (PT). Condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve sua tentativa de candidatura enquadrada na Lei da Ficha Limpa pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não podendo disputar as eleições.

Com pouco tempo pela frente, fica a dúvida se Lula será capaz de transferir seu potencial eleitoral para Fernando Haddad e levá-lo a um segundo turno contra Jair Bolsonaro (PSL). Caso isso não ocorra, ganham Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT), que podem ser beneficiados pelo chamado “voto útil”.

“Tem o candidato preferido e o que você odeia. Então, o preferido não se mostra viável e você prefere votar no mais viável. Está se configurando para que isso aconteça”, avalia Barreto, que aposta em Marina como uma forte concorrente para alcançar o segundo turno nesse cenário.

Fim da polarização

Caso isso aconteça, será a quebra de uma série de quatro eleições polarizadas entre PT e PSDB. Desde 2002, o candidato petista esteve à frente em praticamente todas as pesquisas, seguido por um oponente do PSDB. Somente em 2014 houve uma terceira via que quase colocou fim a essa série — justamente Marina Silva, então candidata pelo PSB. Em segundo lugar nos levantamentos, foi superada na última semana pelo tucano Aécio Neves [confira mais na página anterior].

Outra convenção em xeque neste pleito é o horário eleitoral no rádio e televisão. A propaganda é a grande esperança de Geraldo Alckmin (PSDB) para crescer nas pesquisas. Com uma chapa extensa e mais de 40% do programa e das inserções nos intervalos, o tucano aproveita o espaço para tornar-se mais conhecido. Mas enfrenta suas próprias fragilidades.

Para o cientista político Leonardo Barreto, o cenário é “bem difícil, até dramático” para o PSDB, em virtude do desgaste do partido, de sua ligação com o chamado “Centrão” e das denúncias de corrupção.

Caso PT e PSDB fiquem de fora do segundo turno, outra tendência será quebrada. Nas últimas quatro eleições, os dois candidatos que avançaram tinham mais de 55% do horário eleitoral. Mais bem posicionados nas pesquisas de 2018, Bolsonaro, Ciro e Marina têm juntos 1 minuto e 7 segundos de 12 minutos e 30 segundos dos programas presidenciais.

O fator Nordeste

As diferenças regionais também terão papel preponderante na definição do segundo turno. Desde 2002, quando não venceu em apenas um estado, o PT vem perdendo terreno no país. Na disputa de 2014, Aécio Neves (PSDB) ganhou em 12 estados, configurando um mapa de quase perfeita divisão do Brasil entre um Centro-Sul tucano e um Norte e Nordeste petistas.

Ainda com enorme força no Nordeste, Lula teria mais de 50% dos votos em todos os estados da região, segundo pesquisas do Ibope de final de agosto. Todavia, há dúvidas se isso se transferirá para Fernando Haddad, político paulista e pouco conhecido pelo país afora. “Há ainda um candidato competitivo no Nordeste, o Ciro Gomes, que deve reduzir o poder de fogo do PT”, pondera Barreto.

Enquanto isso, até o fechamento desta edição da VOTO, nas regiões Sul e Sudeste, o PSDB amarga a perda de seu eleitorado para Jair Bolsonaro, que supera Alckmin até mesmo em São Paulo. Nos antes redutos tucanos, o deputado fluminense atinge índices que superam os 30% das intenções de voto.

Essas questões só serão dirimidas quando as urnas apresentarem a voz dos brasileiros. Até lá, seguirão vivas e intensas as especulações da eleição mais complexa e imprevisível desde a redemocratização.

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