O presidencialismo de coalizão está de volta, por Leonardo Barreto

Leonardo Barreto é Doutor em Ciência Política (Universidade de Brasília) e diretor de conteúdo da Vector Relações Governamentais
(@LeonardoCapPol)

Embora seja tentador analisar os efeitos da chegada de Arthur Lira (PP/AL) e Rodrigo Pacheco (DEM/MG) às presidências do Legislativo brasileiro a partir das características pessoais de cada um, é imperativo lembrar que o contexto político é o que importa primeiro. Nesse sentido, talvez nenhum dos dois estivesse ali se não houvesse uma decisão inequívoca do governo de influenciar na decisão de deputados e senadores. Não há dúvida: o presidencialismo de coalizão como motor decisório da política brasileira está de volta.

A retomada desse modelo é um desafio novo para o presidente Jair Bolsonaro. Isso envolve gerenciar um grupo heterogêneo e centenas de micro acordos que são negociados e renegociados de forma permanente. Além disso, significa abandonar a atitude hostil que alimentou em relação ao Congresso Nacional desde a sua posse até o agravamento da pandemia. O desdobramento natural após as escolhas de Lira e Pacheco é a realização de uma reforma ministerial que contemple a nova pesagem do poder, mirando a acomodação de grupos para criar satisfação suficiente para fazer andar pautas urgentes.

O fato da vida é que Bolsonaro tem que correr, pois o ambiente favorável atual do Congresso Nacional pode mudar muito rapidamente. Há pressão social e fiscal extrema, que vai exigir a votação de medidas impopulares para que seja possível construir um equilíbrio entre políticas de alívio e sustentação orçamentária. Espera-se que Bolsonaro assuma o custo desta agenda, dividindo-a com o Legislativo. Sem isso, deputados e senadores podem rapidamente se tornar avessos ao governo.

Outro elemento que reforça a tese de maior presença do governo nos trabalhos do Legislativo é o fato de que Arthur Lira e Rodrigo Pacheco (DEM/MG) não serem reconhecidos pelas suas ideias econômicas. Há políticos que possuem convicções quanto a modelos de desenvolvimento específicos e há outros que priorizam os jogos de poder e o cálculo político (um não é necessariamente melhor do que o outro) e ambos parecem pertencer ao segundo grupo e, em tese, estão mais suscetíveis à influência da direção econômica do governo.

Embora Lira tenha dito que a pauta emergencial será definida em conjunto com todos os deputados, é fato que seu grande ativo é o conhecimento da racionalidade dos políticos. Nesse sentido, em uma eventual parceria com Guedes, Lira pode ajudar a encontrar compensações para cada medida impopular da pauta. O primeiro teste é a aprovação de um auxílio (ou reestruturação do Bolsa Família) em troca da PEC Emergencial ou a aprovação de um novo imposto.

Em um cenário de muita incerteza, só existe o curto prazo. Não endereçar satisfatoriamente as reformas (apresentar e articular para aprovar), reduzirá a paciência e a confiança de setores econômicos e políticos ainda depositam em Bolsonaro. O retorno do presidencialismo de coalizão oferece possibilidades, desde que se tenha capacidade de entender e lidar com um ambiente mais sofisticado e complexo. Bolsonaro ainda não experimentou esse papel desde que chegou ao Planalto. Mas sabe como a banda toca, tendo visto esse jogo muitas vezes no papel de deputado.

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