Quando o Parlamento se omite

Há uma pedra no meio do caminho e ela não está servindo de inspiração a Drummond. A necessária racionalização de nosso modelo institucional, a mudança das regras do jogo político, mexeria com interesses daqueles que, vitoriosos no sistema vigente, temem criar riscos ou incertezas às suas carreiras. O tempo mais perdido da minha vida foi o que gastei assistindo a infindáveis sessões de comissões parlamentares tratando de reforma política.

No entanto, esse assunto tem de ser levado a sério num ano eleitoral. O Brasil subiu no telhado e a informação a respeito não viaja de navio. As projeções que disso se extraem ficam disponíveis online. O World Economic Forum (WEF) de 2017 classificou as instituições brasileiras em 109º lugar num conjunto de 137 países analisados. Claro, alguém, feliz da vida, otimista como o Dr. Pangloss de Voltaire, pode afirmar que está tudo indo muito bem e que esse pessoal do WEF deve ter algum problema de visão que impede captar as “virtudes” de nosso modelo político.

No entanto, isso é mais ou menos como fechar as janelas para não ouvir os miados do gato no telhado. Um país que, de modo continuado, perde posições nos rankings internacionais em tudo que importa; cujo risco de crédito vem se elevando, segundo as principais agências; e cujos poderes de Estado se encontram em absoluto descrédito, não pode fechar os olhos, imaginando, assim, não ser visto.

Sempre me pareceram incompatíveis com um ano eleitoral as expectativas de crescimento do PIB de 2018, estimadas, no ano passado, como próximas a 3%. Por quais estranhos motivos se animariam os agentes econômicos se o cenário era tão pouco animador? Se tantos partidos e lideranças políticas colocavam seus próprios interesses acima do bem do país? Se os vícios do modelo político se apressavam para entrar em atividade e se era tão incerto o futuro? Já soara bem antes o alerta de que o dólar haveria de subir, a bolsa cair, e a economia recuar os dedos, resguardando os anéis restantes para depois da roleta eleitoral. Não é isso que nos ensina a experiência? A única coisa certa na hora incerta é a cautela com o dinheiro, seja você consumidor ou empreendedor. As instituições brasileiras são uma usina de incertezas.

Pois bem, para ajudar a complicar, há mais de um ano, o Supremo Tribunal Federal é o mais ativo protagonista da política nacional. Seus ministros dominam o noticiário com monocráticas declarações e com colegiado silêncio ante as amarguras nacionais. Sem a menor cerimônia, ministros assumem papel regencial, interferindo no rumo dos acontecimentos e das candidaturas. Muitos fazem coro às honoráveis palavras do senador Romero Jucá quando desabafava sobre a necessidade de estancar a sangria dos corruptos. A sociedade? Esta que vazasse plasma e hemoglobina pelas sarjetas da violência e das carências. Era preciso parar a Lava Jato. E há ministros do STF a disfarçar seu servilismo a esse objetivo com rompantes de uma orgulhosa e não reconhecível dignidade.

Quando o Congresso Nacional acordará de sua letargia, assumir-se-á como poder e conferirá racionalidade às nossas instituições?

Por Percival Puggina, jornalista

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