VOCÊ ACREDITA NA URNA ELETRÔNICA?

Neste ano acontece uma nova eleição para a escolha de prefeitos, vice-prefeitos e vereadores dos 5.570 municípios do Brasil. O primeiro turno ocorrerá no dia 4 de outubro, e o segundo, no dia 25 do mesmo mês. Sendo assim, o Grupo VOTO levantou o seguinte questionamento: “Devemos acreditar na urna eletrônica?”.

O sistema começou a ser implementado no Brasil ainda em 1996, e desde o ano 2000, o país decidiu abandonar o voto em papel. As urnas eletrônicas, porém, são polêmicas e geram diversos questionamentos por parte da população e, claro, de parlamentares. Por isso, em 2015, o voto impresso voltou a ser discutido a partir da aprovação de uma emenda legislativa, durante uma minirreforma política, porém, a medida não foi adotada nas eleições municipais de 2016 por falta de tempo.

Na época, o senador Lasier Martins trabalhou fortemente pela emenda. Segundo ele, a desconfiança foi o que motivou a minirreforma eleitoral. – “Venho a esta tribuna lembrar e pedir, porque, se houve recursos, que é uma queixa do Tribunal Superior Eleitoral, de que a Justiça Eleitoral não teria recursos financeiros para suportar a aparelhagem das milhares de urnas brasileiras para esse pleito. Ora, se tivemos aí o fundo eleitoral bilionário, por que não haveremos de ter para o processo eletrônico, conferido pelo voto impresso?”

Conforme o cientista político e assessor jurídico do senador Lasier Martins, Ismael Almeida, que assessorou o senador na defesa da tese, o voto impresso determinado pelo Congresso Nacional não é uma ação de desconfiança sobre o sistema. – “Pelo contrário, trata-se de um fiador dessa mesma robustez do processo. O voto impresso não se trata de um retrocesso no sistema de votação e apuração, apenas uma garantia a mais em favor do desejo popular. Com ele seria possível obter a prova cabal de eventual fraude no equipamento ou na transmissão das informações.”

OUTROS PAÍSES

Almeida acrescenta sobre o fato de as pessoas questionarem o motivo pelo qual o voto eletrônico não acontece em alguns países desenvolvidos. “Os processos eleitorais e de votação em outros países não são comparáveis aos nossos, pois envolvem sistemas como o de cartão perfurado e têm apuração localizada.”

O chefe da Seção de Orientação e Suporte em TI do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, Luís Fernando Schauren, destaca que a premissa de que países desenvolvidos usam o voto impresso por segurança, está errada. Segundo ele, vários países de primeiro mundo utilizam o voto eletrônico, inclusive os Estados Unidos. “Segundo o Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral, pelo menos 35 países utilizam dispositivos eletrônicos para votação sem registro em papel. Podemos destacar nessa lista outros países, como França, Itália, Estados Unidos, Canadá, Índia e Coréia do Sul. É verdade que nos Estados Unidos, especificamente, não utilizam o voto eletrônico em todo o país, já que os estados ou condados tem autonomia pra legislar sobre o modelo de votação que será usado. E como a maioria dos protótipos de urna eletrônica são oferecidos pela iniciativa privada, várias localidades acabam utilizando equipamentos de modelos e características distintas para votação.”

Autor da proposta que aprovou o voto impresso no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro viu a medida ser derrubada pelo Supremo Tribunal Federal, que considera o sistema inconstitucional. “O Tribunal decidiu que a versão impressa viola a garantia constitucional do segredo do voto, já que seria possível identificar o eleitor”, entendeu a Suprema Corte ao analisar a questão. Até então, nenhuma fraude foi comprovada pelo Ministério Público ou pela Polícia Federal.

TRANSPARÊNCIA

O advogado e especialista em Direito Eleitoral, Antônio Augusto Mayer dos Santos, diz que a urna eletrônica brasileira impede várias modalidades de fraude, torna mais fácil o ato de votar e acelera o resultado da eleição. No entanto, a cada eleição, as desconfianças sobre ela são reavivadas. “Somente será confiável quando for independente do software e passível de conferência por auditorias. Os partidos não conseguem desenvolver programas próprios para proceder na conferência das assinaturas digitais das urnas espalhadas pelo país. O sistema adotado, conhecido como Direct Recording Electronic, é ultrapassado e não permite que os eleitores confiram o que foi gravado no registro digital nem as agremiações de proceder numa contagem ou recontagem de votos.”

Para as eleições de 2020, vai haver uma pequena mudança neste sentido. A auditoria do sistema eletrônico de votação terá como novidade a ampliação do número de entidades fiscalizadoras, para permitir a participação do Conselho Nacional de Justiça, do Tribunal de Contas da União, das Forças Armadas, de Institutos Estaduais de Criminalística, de entidades privadas sem fins lucrativos com atuação em transparência e gestão pública e de departamentos de Tecnologia da Informação de universidades.

O Tribunal Superior Eleitoral disponibilizou uma página em seu site oficial, com o objetivo de esclarecer dúvidas a respeito da urna eletrônica. A seção recebeu o nome de “Segurança do Processo Eleitoral”. Da história do equipamento até mitos e verdades, a página busca mostrar os recursos de cibersegurança presentes na urna, para garantir a integridade, confiabilidade e autenticidade do processo eleitoral.

Para oferecer mais transparência, o TSE estuda disponibilizar o código-fonte das máquinas. Conforme Schauren, a abertura do código passa pela maturidade das equipes de desenvolvimento e da comunidade para o qual esse código seria exposto, já que a experiência dos últimos anos, com os Testes Públicos de Segurança, é de que qualquer falha identificada, por menor que seja, costuma ser tratada com muito sensacionalismo.

Luís Fernando Schauren defende que a comunidade científica trate com mais responsabilidade a divulgação de eventuais falhas, contextualizando o problema e analisando os possíveis riscos em conjunto com as outras barreiras de segurança. “A abertura do código é um processo gradual, que deve ocorrer aos poucos, inicialmente em grupos restritos, até que se chegue a um ponto de maturidade que possibilite uma abertura mais ampla. Do ponto de vista de logística, é necessário disponibilizar tempo e recursos para que a equipe de desenvolvimento forneça o suporte necessário à comunidade científica.”

CUSTOS

No sentido de geração de custos para os cofres públicos, percebe-se que tanto para um quanto para outro sistema de votação, isso deve acabar acontecendo. Afinal, para garantir segurança no voto eletrônico é preciso investir em melhorias de fiscalização e auditoria e, para implementar o voto impresso é preciso acrescentar impressoras às urnas atuais. O cientista político Ismael Almeida acredita na necessidade dos investimentos. – “O aumento de custos é real pois se trata do acréscimo de impressoras às urnas atuais, mas consideramos as projeções de dispêndio exageradas e os prazos oferecidos para a adaptação exequíveis. Além do mais, acreditamos que qualquer gasto em favor da credibilidade da democracia brasileira tem um valor bem maior do que o valor contábil e orçamentário.”

Atualmente, a Proposta de Emenda à Constituição 135/2019, que exige a impressão de cédulas em papel na votação e na apuração de eleições, plebiscitos e referendos no Brasil, está aguardando a criação da comissão especial pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados para apreciação e só depois votada em dois turnos pelo Plenário da Câmara.

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