Voto em lista inconstitucional – Por Antônio Augusto Mayer dos Santos

Vários congressistas têm defendido a introdução do voto em lista fechada já para as eleições de 2018. Esse movimento gira em torno da Proposta de Emenda à Constituição nº 61. Porém, alguns esclarecimentos básicos são suficientes para evidenciar a sua total inadequação e inconveniência ao Brasil.
Datada de 2007, a PEC objetiva instituir o voto indireto para parlamentares e sacramentar de vez o despotismo das cúpulas partidárias. Seu trâmite junto ao Senado Federal mais pálido e burocrático não poderia ser. Mesmo com a relevância que o tema ostenta, jamais foi objeto de uma audiência pública ou debate. Levou quatro meses para ter o seu primeiro relator. Foram sete relatores ao longo de quase uma década.

Ainda tem mais. A sua justificativa apartada da realidade brasileira invocou, a pretexto de parâmetro, países cuja estrutura e sistemas partidários e eleitorais nem de longe se assemelham aos daqui. Vejamos. Na Alemanha, onde o federalismo é efetivo e modelar, o voto é facultativo e há uma rigorosa cláusula de barreira. A Nova Zelândia funciona em regime de monarquia unicameral. No Japão, o voto também é opcional e as campanhas eleitorais não permitem sequer a distribuição de impressos. Na Itália predomina um hiperpartidarismo que já supera 300 siglas e ex-presidentes da República são senadores vitalícios. A Rússia, que tem apenas dois partidos realmente fortes (PCFR e Rússia Unida), é considerada um país não livre pela Freedom House. A Venezuela é uma ditadura, tem cinco poderes constituídos e os seus congressistas podem exercer apenas três mandatos consecutivos.

Contudo, a sua principal característica está mesmo na agressão à Constituição Federal. Primeiro, quando desrespeita o seu artigo 14, cuja redação dispõe que a soberania popular será exercida por sufrágio universal e voto direto e secreto. Depois, nocauteando o inciso II do § 4º do artigo 60, o qual assegura que esse voto direto é cláusula pétrea. Ou seja: não é um tema que possa ser objeto de emenda em legislatura alguma. Somente uma constituinte poderia estabelecer a modificação desses tópicos constitucionais.

O súbito interesse de congressistas pela PEC nº 61/07 não é impulsionado pelo aperfeiçoamento democrático ou da representatividade parlamentar. Não tem nada de patriótico. É vitaminado apenas pelo receio de derrota nas urnas e consequente perda do foro privilegiado. Uma combinação de engodo e casuísmo temperada com inconstitucionalidade.

Antônio Augusto Mayer dos Santos é advogado

aamsadv@gmail.com

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