Muito além de grãos – Por Igor Morais

Os números referentes ao 1º trimestre de 2017 mostraram o quanto a atividade agropecuária permanece como o principal pilar de sustentação da economia brasileira. Foi responsável por quase 3/4 do resultado de crescimento de 1% do PIB, o primeiro indicador positivo depois de oito trimestres consecutivos de queda. Não é a primeira vez que o setor mantém sua pujança, a despeito do cenário recessivo que atinge o país. Essa performance pode ser verificada apesar de o setor contar com apenas 5,5% sobre o total de riqueza gerada anualmente no Brasil e 3,1% dos empregos formais. No entanto, se nosso olhar ficar restrito apenas a esses indicadores, estaremos minimizando a importância da agropecuária para a economia.

A presença no cenário internacional atesta de forma ímpar nossa eficiência no campo. Somos o maior produtor mundial de café, cana-de-açúcar e laranja, segundo maior produtor de carne de gado e galinha, soja, feijão, tabaco, mamão, abacaxi e couro, o quarto maior em coco, banana e leite de vaca, quinto em seda, limão e algodão e o sexto em ovos. A lista é ainda maior envolvendo diversas outras culturas e cresce mais quando agregamos produtos extraídos das fazendas como a produção de celulose e outras madeiras e minério de ferro. E, se ainda quisermos somar nessa análise o que se conhece como agronegócio, então teremos uma dimensão ainda mais significativa, podendo chegar, dependendo da metodologia utilizada, a 22% do PIB (considerando a produção de móveis, produtos de madeira, têxtil e produtos de couro, além da indústria de máquinas e equipamentos voltados para a atividade agropecuária e os diversos serviços relacionados).

Basta notar que, em meio à maior crise já enfrentada pela indústria brasileira a produção de tratores e máquinas e implementos cresceu quase 10% nos últimos 12 meses. Além disso, os produtos básicos, que representavam 22% do total das nossas exportações no início da década passada, agora chegam a 50%, gerando um saldo comercial de quase US$ 70 bilhões por ano. Tudo isso conseguido mesmo diante dos percalços que compõem o custo Brasil: deficiência de infraestrutura de transporte e armazenamento, dificuldade de liberação e alto custo de crédito, ameaças de invasão em fazendas e constantes ações políticas que minam a vontade empreendedora no Brasil em todos os segmentos.

Mas há uma mudança em curso com as evoluções tecnológicas no campo de ciência de dados, e que podem fazer com que o setor agropecuário tenha a chance de alcançar crescimento e destaque ainda maior.  É o que se denomina de a quarta revolução industrial, que traz consigo a quebra de diversos paradigmas no funcionamento dos mercados de trabalho, comercialização, produção, venda e gestão. É cada vez mais frequente o uso de ferramentas que envolvem inteligência artificial, e o produto do que se conhece como IoT – Internet of Things – está revolucionando diversas áreas da nossa sociedade.

Como isso chega ao campo? Dentre outras possibilidades, destaca-se o acesso a câmeras de alta definição ligadas a drones, sensores e diversos outros sistemas que podem tornar a produção agropecuária cada vez mais previsível e eficiente. É o que se denomina de agricultura de precisão. As aplicações são várias, e vão desde o uso de imagens para identificar características específicas do solo até técnicas de reconhecimento facial aplicadas em rebanho. Imagine um sistema de irrigação que consegue identificar o equilíbrio perfeito da quantidade de água necessária para a evolução de uma planta em tempo real. Ou então, um sistema que detecta, a partir de fotos de satélite, anomalias em pontos específicos da fazenda e que informa o produtor, pelo celular, permitindo assim ações preventivas diante de um cenário de perda potencial. Estamos diante de um processo que permitirá alocação mais eficiente de insumos e antecipação perante a natureza.

Um exemplo real do uso de tecnologia de última geração associada a técnicas de Machine Learning no segmento no Brasil é a Gap Economics. A empresa faz uso de imagens de satélite atualizadas em um período máximo de 48 horas para detectar desde as qualidades de nutrientes no solo nu, antes do plantio, que irão ajudar o produtor a determinar as deficiências, até a presença de problemas no crescimento do cultivo. Tal recurso mostra resultados promissores em relação a redução de custos, melhora da produtividade e, consequentemente, aumento da rentabilidade. E não fica restrita a grandes produtores. A redução de custos já permite que fazendas pequenas possam ter acesso a essas tecnologias.

Em um futuro muito próximo teremos a diminuição de incertezas quanto ao desempenho da safra, com repercussões diretas sobre os custos de financiamento. Os bancos que fornecem crédito para o segmento, por exemplo, poderão saber, em tempo real, se uma determinada região está com maior probabilidade de quebra da produção, sem precisar esperar as demoradas e caras pesquisas de campo.

A oportunidade que se desenha para a competitiva agropecuária brasileira é imensa. E muitas surpresas ainda virão para facilitar essa gestão. Já estamos muito além do grão.

Para saber mais

http://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-do-agronegocio-brasileiro.aspx

Schwab, Klaus, The Fourth Industrial Revolution, World Economic Forum, 1ª edição, 2016.

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