Obama, vamos sentir saudade! – Por Marta Suplicy

Barack Obama assumiu os Estados Unidos na mais profunda crise econômica que o país atravessou, desde a Grande Depressão, a quebradeira de 1929. Oito anos depois, deixou a Casa Branca com um legado e tanto: economia em expansão, com queda de desemprego e aumento de renda chegando a ser comparado ao pai do “New Deal”, outro grande estadista democrata, Franklin Delano Roosevelt. Avançou no campo humanitário com o Obamacare, nos direitos dos LGBTs, das mulheres e no combate ao preconceito. Será lembrado pela aproximação com Cuba e a diminuição de intervenções belicosas dos EUA no mundo. Obama detém inestimável capital político. Sabe e administra bem isso: ao se despedir, com a elegância, o bom senso e a crença no ser humano que sempre imprimiu em seus discursos, enfatizou o custo de uma sociedade dividida e que não respeita a diversidade. Reiterou a importância dos cuidados na manutenção da democracia: mesmo nas mais consolidadas. Emocionou-se ao falar de Michelle e filhas, defendeu com paixão o seu legado e acertou com muita precisão seus alvos.

O mundo parece ter mergulhado numa era de fortes retrocessos. O que temos assistido neste planeta é um movimento ímpar. Excluídos da globalização, com nações progredindo, mas com parte de sua população alijada dessa riqueza e de oportunidades. Veio a resposta com o Brexit e Trump. Sem dúvida, frutos da modernidade que abandonou os desempregados, substituídos pela tecnologia e globalização.

Por outro lado, a onda migratória que invade a Europa é outra demonstração do “desarranjo” internacional. As contestações que Angela Merkel enfrentou por compreender bem e na pele o drama de vidas que tentam se agarrar a uma nova chance mostram o lado sombrio de quem não tem emprego nem pão. Nem apelos do papa Francisco, que tem sido uma voz de acolhimento, rompendo barreiras seculares, têm sensibilizado tanto quanto poderiam.

Não é nada simples enfrentar essas questões, pois quanto mais difícil é ingressar no mercado de trabalho mais individualismos e até um certo egoísmo perceberemos nas relações com as demais pessoas. São os mais jovens, que não têm experiências, brigando por oportunidades, ou na outra ponta, os mais velhos e melhor remunerados, que não conseguiram manter seus postos. No entanto, como bem disse Obama de seus aprendizados: “Mudanças só acontecem quando pessoas comuns se envolvem, se engajam e, juntas, as demandam”.

Quanto mais aprofundarmos as diferenças entre nações e aumentarmos o fosso de acesso ao bem-estar das próprias e menos pensarmos em soluções não excludentes, mais comprometeremos o futuro de todos.

No Brasil, o Congresso Nacional tem travado os principais debates que têm a ver com uma pauta que avance em inclusões. Nada passa dentre o que tem a ver com identidade de gênero, educação de gênero, reconhecimento de direitos aos LGBTs, empoderamento de mulheres, incluídos aí os direitos reprodutivos.  Sempre estamos às voltas com manobras: num momento para enterrar a criminalização da homofobia (PLC 122 foi arquivado), noutros para não acontecer a votação de projetos como o meu 658/2011, que reconhece os direitos à identidade de gênero e à troca de nome e sexo nos documentos de identidade de transexuais.

Ingressei na carreira política defendendo direitos das mulheres, de LGBTs, diversidade, direitos humanos. De lá para cá, muitos debates se fizeram e o Judiciário foi se posicionando e firmando decisões em prol das minorias. Tivemos o reconhecimento da união estável para casais homoafetivos, por exemplo. Persisto, porém, na ideia de que o Legislativo deve caminhar em direção ao reconhecimento de direitos de cidadania.

Nações com leis mais justas e que reconhecem o direito reprodutivo da mulher como escolha individual têm resolvido melhor problemas sociais e econômicos: Alemanha, França, Portugal e Canadá. Importante: a posição da mulher, nesses países, também é melhor (salários com menor diferença em relação aos dos homens, nível educacional e, consequentemente, mais equilíbrio nas relações de gênero).

Em sua despedida, ainda disse Obama: “Eu peço que vocês acreditem. Não em minha capacidade de promover mudança, mas na sua”. Faço minhas suas sábias palavras.

Por MARTA SUPLICY, Senadora pelo PMDB-SP

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