A cultura empresarial em revisão

Quem no meio empresarial ainda não aprendeu o significado da palavra compliance está ameaçado. E a exigência vai além da mera capacidade de traduzir o termo do inglês (conformidade). É preciso compreender a mudança nas práticas e na cultura organizacional no relacionamento com o poder público, impostas pela sucessão de escândalos no Brasil dos últimos anos. As descobertas trazidas por operações como a Lava-Jato, além de devorarem a imagem de políticos, destruíram empresas.

O alerta para a necessidade de aprender o que é compliance e como adotá-la ficou claro com o painel de dois especialistas no assunto no evento Brasil de Ideias realizado pela revista VOTO em 18 de outubro. O advogado Antônio Augusto Mayer dos Santos e o jornalista Andrew Greenlees explicaram por que a palavra inglesa que ganhou força em 2017 no ambiente de negócios vai além de um modismo ou de uma simulação teatral de gestão.

“Compliance é a integridade de atuar em conformidade com as regras”, resume Greenless. “E é um diferencial competitivo.”

Fundador da Flag Public Affairs, consultoria focada em serviços de relações institucionais e governamentais, Greenless testemunhou o poder da cultura de compliance nos Estados Unidos quando correspondente da Folha de S.Paulo em Washington. Na sociedade americana, onde a compliance está mais disseminada, a comparação entre um jogo de palavras em inglês demonstra como se compreende que a relação de integridade fortalece a imagem da empresa e cria um ambiente favorável para os negócios: envolve a relação íntegra da empresa com todos os seus stakeholders (partes interessadas, principalmente os acionistas), que também podem ser considerados shapeholders, os formadores da reputação da empresa.

“Reputação é um valor intangível, mas cada vez mais importante no negócio”, lembra Greenlees.

Não quer dizer o divórcio entre a iniciativa privada e o poder público. Essa relação é indispensável, alertam os dois especialistas. A questão é que deve ser profissionalizada. E, para isso, é preciso regulamentar uma palavra que no Brasil se transformou em palavrão mas que na sua origem tem um propósito legítimo: o lobby.

A questão está em discussão no Congresso há mais de 10 anos.

“É positivo que haja a regulamentação do lobby, em andamento na Câmara”, espera Antônio Augusto. “O lobby é a organização dos interesses de maneira legal e efetiva.”

Ao profissionalizar o lobby, há uma chance de a relação entre as empresas e os políticos ficarem mais transparentes e até se aproximarem de uma maneira menos parasitária. “O Congresso só se aproxima das empresas em época de eleição”, diz Antônio Augusto, advogado especialista em Direito Eleitoral, escritor, consultor e colunista da Revista VOTO desde sua fundação.

O que fazer

A pedido da revista VOTO, os dois especialistas citaram o que é necessário para implantar a cultura de compliance em uma empresa e como regulamentar o lobby. Confira o roteiro a seguir:

Adotando a compliance

Andrew Greenlees:

“O primeiro passo para uma empresa é dominar a questão formal. São necessários um treinamento da equipe, a criação de um código de conduta e a abertura de canal de ouvidoria, por exemplo. Há uma série de ações formais. Mais importantes do que elas, é a vontade genuína de transformar as novas práticas em cultura.”

“Para dar apoio às empresas nessa mudança de cultura organizacional e adoção de novas práticas de relacionamento com o poder público, escritórios de advocacia estão se reforçando. É crescente a demanda das empresas que entenderam a necessidade de um relacionamento profissionalizado com o governo.”

Regulando o lobby

Augusto Mayer dos Santos:

“O primeiro passo é a transparência na definição dos conceitos sobre os profissionais que atuam e algumas cláusulas de limites sobre os objetivos que devem ser alvo do lobby. Não se pode, por exemplo, estabelecer lobby para o tráfico de drogas ou de amas.”

“Também é preciso definir que tipo de profissional estará apto a exercer a atividade e como: estabelecer uma legislação criteriosa que obedeça a conceitos constitucionais como legalidade e moralidade.”

“Também é necessária a organização de mecanismos de controle da atividade profissional do lobista.”

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